Marisa Orth chegou a São Paulo para estrear a peça “O Inferno Sou Eu”, na qual vive Simone de Beauvoir – uma personagem bem distante do gênero que a consagrou, a comédia. Para o diretor da peça, entretanto, há muito mais semelhanças entre a atriz brasileira e a filósofa francesa do que se possa imaginar à primeira vista. “As duas são mulheres vulcão: você não pode tapar, não pode calar ou se queima”, disse José Rubens Siqueira na coletiva de imprensa realizada nesta sexta-feira (15) para apresentar o espetáculo que estreia no dia 22.
A montagem do texto de Juliana Rosenthal K. é o encontro fictício de Simone – ainda doente de tifo, que contraiu em sua passagem pela Amazônia – com a estudante Dorinha (Paula Weinfeld) durante sua visita real ao Recife, em 1960. “É o encontro da fã com o ídolo. Aos poucos, se cria uma relação entre as duas e ela passa a enxergar além do mito”, contou Paula.
Marisa Orth também falou do desafio de interpretar a francesa em um momento tão delicado e das expectativas do público sobre sua faceta cômica. “Se isso chamar público, pode vir. Mas desde o início essa relação se perde, pois Simone está doente, antipática, de mau humor. Eu acho que dá para me garantir. Além disso, a saia é aqui”, afirmou a atriz, rindo e apontando para o tornozelo.
Confira os melhores momentos da coletiva.
• Você imaginou que poderia interpretar uma personagem como Simone de Beauvoir no teatro? Qual é a sua versão da filósofa e escritora?
Marisa Orth – Nunca imaginei que faria alguém como ela, que é mais contemporânea, há registros dela andando por aí. Simone é quase do meu tempo. Dá para ver que é um personagem bastante controvertido e ela tinha uma coisa irônica, cortante... é um mau humor engraçado. [Para fazer a peça] Não vou direto para a Simone, eu vou pelo texto da Ju. Gostaria que uma pessoa que nunca tivesse ouvido falar de Simone gostasse da peça, que não fosse necessário ler uma bibliografia para entender.
• Por que você chorou quando a Juliana te mostrou o texto da peça?
M – A Simone trata de questões que o ser humano, a mulher ainda não descobriu a resposta. Nem eu e nem ela estamos certas. A Simone é uma mulher que não só escreveu sobre isso [o existencialismo], como viveu isso, contou. É muito emocionante, porque ela foi uma mulher de muita coragem.
• É uma peça sobre a questão da mulher?
José Rubens Siqueira – É sobre a condição humana. A gente vive em uma sociedade muito restritiva também para o homem. A peça é feminina, mostra uma ótica feminina, mas se amplia para a condição humana. Simone de Beauvoir e Jean-Paul Sartre eram filósofos, franceses, racionalíssimos. Eles fizeram de suas teorias um exercício de vida. A Simone dizia isso muito claramente: é preciso preservar a felicidade.
• Você sente alguma dificuldade por ser mais conhecida pelas comédias?
M – Graças a Deus eu fiz muito sucesso com comédias, principalmente na TV, que movimenta muito público. Mas fazer um personagem de drama bem feito é mais fácil. A dificuldade, pode parecer arrogância minha, mas é quando o personagem é mal escrito.
J – É difícil fazer coisa boa. Cada gênero tem sua dificuldade específica. Essa é uma peça de enorme intensidade dramática, com momentos tocantes, triste e outros muito engraçados. Ela pega a gente pelo significado da existência humana.
• Você está preocupada com a reação da crítica e do público por ser conhecida pela comédia?
M – Estou muito nervosa, mas não pela questão de já ter feito comédia. Estou ansiosa porque é teatro, que é sempre uma peça sinfônica... é quase uma hora sem parar. Quem vê meu trabalho consegue desvincular [os papéis cômicos dos trágicos]. Esse personagem é muito exigente, precisa de muita concentração.
J – Tive um cuidado desde o começo para desarmar a possibilidade do público desse tipo de possibilidade [de encarar algum gesto de Marisa como engraçada] para que a audiência possa aproveitar um tipo de interpretação tão potente quanto a que ela apresenta na comédia.
Colherada Cultural
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